Minha vida pós-apocalíptica zumbi

Acordei hoje de manhã e tudo parecia normal. Levantei, lavei meu rosto, olhei no espelho, me achei o cara mais lindo do mundo, tomei meu café e acendi um cigarro. E foi aí que notei que a conta não batia: tinha alguma coisa errada.

É Carnaval e na rua onde eu moro, independente de ser ou não data festiva, sempre tem balbúrdia, principalmente na casa ao lado em que o casal vive saindo no soco por qualquer coisa – os dois se conheceram numa luta de boxe, se apaixonaram, se casaram e há uns quinze anos eles vivem nesse torneio infinito, é jab daqui, cruzado dali, gancho, enfim.

Mas hoje tudo estava muito silencioso. Nem um piu. Fui ver o que estava acontecendo e não estava acontecendo nada. Tudo deserto e quieto, a rua como um cemitério. Resolvi então fazer uma visita ao casal de pugilistas pra saber o que tinha acontecido. Apertei a campainha mas parecia não estar funcionando, então resolvi chamar em voz alta “Adalberto!” e nada, chamei mais uma vez e nada e quando estava prestes a chamar uma terceira vez ouvi uns grunhidos, antes pensei que fosse de cachorros mas não, os pugilistas não tinham cães, e os grunhidos foram ficando cada vez mais próximos e quando abri o portão (sim, o portão estava destrancado, dá licença, poética? obrigado) dei de cara com a mulher-pugilista-zumbi e logo atrás vinha o marido, ambos com o rosto verde e os dentes amarelados, e começaram a vir em minha direção, então meu primeiro pensamento foi voltar pra casa correndo, óbvio, mas – óh, que infortúnio! – havia uns quatro zumbis em frente de casa, entre eles o seo Neno, do mercadinho (ainda bem, pois eu devia 50 paus pra ele). “Tô fudido”, pensei.

Mas nem tudo estava perdido: eles ainda não haviam notado a minha presença e o casal-pugilista-zumbi estava atrás de mim a passos lentos, andando em velocidade de cruzeiro. A lerdeza deles me fez ganhar tempo pra pensar e ter a brilhante ideia de pular o muro dos atletas, ir até o quintal deles, pular o muro e cair no meu quintal. Entrei pelos fundos.

E é nesse ponto que o caldo engrossa: eu moro sozinho, meu cigarro tá acabando, tem pouca comida na despensa e uma quantidade razoável na geladeira; não tenho armas de fogo (nunca manuseei uma arma na minha vida) e estava praticamente ilhado, cercado por zumbis. Tudo o que eu tenho pra me defender é um taco de baseball que eu havia ganhado de presente no meu aniversário de nove anos e algumas facas de cortar pão.

E agora estou aqui, fumando um dos meus últimos cigarros enquanto olho pela janela a rua se infestando de zumbis esverdeados babando e grunhindo e tendo que assumir a responsabilidade por mim mesmo.

Além de, comparado a eles, me achar realmente o cara mais lindo do mundo.

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